quinta-feira, junho 23, 2011

Memórias da Casa Maldita



Não, não. Esta é a casa da dona Yayá, mulher muito rica do século passado, e louca. Virou, finalmente, centro cultural, tempos atrás.

Major Diogo, 264, Bexiga. Mas onde está? A numeração mudou, tem um banco, e uma casa demolida que virou só um terreno na cidade devastada.Dela, nem sombra.

Assombrada, como a casa de dona Yayá?

Morada de jornalistas e fotógrafos meio hippies, casa de sala enfumaçada sempre com música boa num Gradiente.

Com minhas calças vermelhas/meu casaco de general, cheio de anéis.

Oh minha hany baby.E uma bíblia cada vez menor. Javan era o hábil manuseador das folhas, logo enroladinhas e recheadas. Não, não era o DJavan, sem a letra D antes, o nome mais estranho: Javan.

Passo por lá sempre, sempre procuro. Onde ficou? Além de na memória dos que frequentavam aquela que virou casa maldita no meio das nossas tantas risadas, e saiu uma vez na manchete do jornal popular, não me lembro por que, mas imagino.

Se alguém quer matar-me de amor/ que me mate no Estácio.

Carlão Augustoi Gouvea, Djavan, Pedrão Martinelli, Victor Passos, Solano José de Souza, jornalistas/fotógrafos dos grandes jornais, todos ali pertinho, na Major Quedinho, na São Luiz.

Coisas que a gente se esquece de dizer. Frases que o vento vem às vezes me lembrar. Coisas que ficaram muito tempo por dizer, na canção do tempo não se cansam de voar. Você pega o trem azul, o sol na cabeça.

Tanta coisa na cabeça. Tanto ardor, tanta alegria, tanto medo, tanta coragem, tanta porrada.
Nada será como antes, amanhã. Que notícias me dão dos amigos? Que notícias me dão de você?

O TBC , do outro lado da calçada, fechado. Vou pesquisar e leio que:

"Desde que a Funarte comprou o TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), no final de 2008, o espaço que sediou uma das maiores revoluções teatrais do país está fechado.Uma reforma foi anunciada no final de 2009 pela Funarte, que afirmou também que abriria uma licitação para preparação de um laudo técnico sobre o imóvel.O então presidente do órgão, Sérgio Mamberti, declarou que as obras estruturais seriam iniciadas em 2010. Até hoje nada aconteceu.

Depois de tanto tempo de abandono, quando não se vê nem mesmo a perspectiva de uma reforma, começam a surgir questionamentos sobre a sobrevivência do TBC. Para garantir a continuidade do lendário teatro, o fundador do Teatro Oficina, Zé Celso Martinez Correa, saiu em sua defesa.

Ele programa para junho o ciclo de peças "Dionizíacas Urbanas Antropófagas em Sampa", em que apresentará seu terceiro espetáculo dedicado à atriz Cacilda Becker".

Quase ao lado da casa de dona Yayá, o TBC também cheio de fantasmas. Antropófagos não dão mais conta, Zé Celso. Agora é tempo de vampiro.

Mas quando existia a casa maldita, não frequentavamos o TBC, quem sabe ele também estivesse fechado pra reformas? That's the question, ó Cacilda Becker! Dinheiro não/beleza pura.

Na casa maldita se reverenciava a arte: a música, o teatro, a poesia, a literatura, tudo sempre enfumaçado, em meio às pautas e às putas,- não poderia deixar de ser, afinal era uma casa de meninos. Dinheiro não/beleza pura.

Viajavam para Paraty, para o Rio e Niterói, para os rincões do país quando os jornais faziam grandes reportagens. Onde estarão os grandes textos, as belas fotos, quando ainda não havia internet? Nos arquivos dos jornais de papel, quem vai achar?

Argonautas do futuro encontrarão papel jornal amarelado?Lá o suor de quem escreveu, o olho de quem captou imagens e desenhos: denúncias, histórias leves, histórias, contadores de histórias, a vida transformada em traço e tipo e Nikon.

Onde tudo isso, esses trechos de vidas tantas , de outra era, não, não mais Belle Epoque?

Entro por vielas feias , escuras, depois de me perder na Aclimação, no Cambuci, no Glicério. Ê cidade! Onde está? Casa maldita suspensa em algum lugar do tempo, não desaparecerá da exata forma que era, porta estreita, corredor comprido, quarto, sala, quarto, quarto, cozinha, quintal. Mesmo que hoje seja: terreno baldio, agência de banco, predinho de três andares, sei lá.

Belezas são coisas acesas por dentro/ Tristezas são belezas apagadas pelo sofrimento










2 comentários:

Dodó Macedo disse...

Texto belezura. Lágrimas negras. Acabou chorare.

Elizabeth disse...

Oi Dodó, sumimos hein? bjs