Macacos, lagartos, bugios, preguiças, corujas orelhudas e seus amigos
Tomem cuidado, o homem vem aí!
O Estado de S. Paulo.
6 de abril de 2009
Caderno Metrópole
O repórter Eduardo Reina fez uma excelente matéria denunciando a morte de 107 animais em virtude das obras do Rodoanel na Mata Atlântica, Parte deles já era ameaçada de extinção.137 foram levados para parques e clínicas veterinárias. O gerente de Gestão Ambiental da Dersa, Marcelo Arreguy Barbosa,afirma, sem qualquer tipo de pejo, que "a culpa é da natureza", e o empreendimento não deve ser responsabilizado.
Mas não adiantou, ontem mesmo o IBAMA multou o Rodoanel em quase R$ 300 mil.
Nada como um bom repórter e uma boa edição, e não podia ser sempre assim a grande imprensa?
Segue a matéria:
Mais de cem animais silvestres já morreram desde o início das obras de construção do Trecho Sul do Rodoanel em áreas de mata atlântica. Parte era de espécies ameaçadas de extinção. São veados catingueiros,macacos, bugios, preguiças de três dedos, lagartos teiús, gambás, cobras, corujas orelhudas e várias passar por manejo cuidadoso, mas tiveram ferimentos graves ou sofreram estresse profundo
– que resultaram em óbito.
De 137animaisenviados para recuperação em parques e clínicas veterinárias, 105 não resistiram.
Outros 371 bichos foram devolvidos para a mata sem
apresentar problemas, segundo dados da Desenvolvimento
Rodoviário S. A. (Dersa), empresa do governo do Estado que administra a obra. Os mortos, contudo, representam 21,9% dos que passaram pelas mãos dos técnicos da Dersa. Os animais encontrados nas áreas desmatadas que precisam receber atendimento veterinário são levados pela Dersa para parques – Pedroso, em Santo André, Estoril, que tem
um zoológicoem São Bernardo do Campo,e Ecológico doTietê,
em São Paulo –, ou encaminhados ao Departamento de Parques e Áreas Verdes (Depave), d da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente de São Paulo.
Pela gravidade dos ferimentos de muitos deles, a Polícia
Ambiental às vezes também os encaminha para veterinários
Particulares ou para um santuário localizado em Cotia, na zona oeste da Região Metropolitana de São Paulo, no sentido oposto das obras do Trecho Sul.
Pesquisador das interferências da ação humana no Parque
Estadual Xixová-Japuí,em São Vicente, o professor da Unesp
Denis Abess acredita que manter animais silvestres em más
condições caracteriza um crime ambiental. “A alta taxa de
morte dos animais remanejados no Rodoanel indica algum
problema na coleta, no transporte ou nos momentos seguintes
dessas operações”, afirma.
“Nesses casos você ultrapassa a esfera do dolo, da intenção.
As mortes poderiam ter sido evitadas. A Lei de Crimes Ambientais só prevê punição quando há vontade livre e consciente de matar. Aqui pode ter havido
imprudência, imperícia ou negligência.
Se ficarem provadas, os responsáveis poderão responder
pelos danos. Já na esfera civil poderão ser punidos administrativamente, com multas”, explica o jurista Jair Jaloreto Junior, especialista na área ambiental.
MUTILAÇÃO
Entre os bichos que sobreviveram está uma preguiça de três
dedos que chegou em outubro de 2007 ao santuário Rancho
dos Gnomos,que há 18 anos acolhe animais silvestres em Cotia.
Ela tinha parte do corpo queimado por fios de alta tensão e
teve a pata esquerda amputada, porque as garras haviam sido
mutiladas. “Por sorte conseguimos tratar e o animal sobreviveu”, conta Marcos Pompeu, do santuário.
Sua mulher, Silvia, lembra que durante as obras do Trecho
Oeste do Rodoanel,entre 1998 e 2002, também recebeu vários
animais precisando de tratamentoveterinário.“
Hoje só acolhemos casos de emergência.A Polícia Ambiental sempre trouxe os animais para cá, mas não recebemos nenhum dinheiro da Dersa pelo que fazemos.”
O Rancho abriga atualmente quatro centenas de animais
silvestres, incluindo 13 leões que estavam em circos, um tigre,
uma jaguatirica, além de preguiças, macacos e aves.
Outro animal vítima das obras do Trecho Sul é um macaco
bugio, que teve quatro dedos de uma mão queimados em fios
elétricos. “O Juninho chegou ainda bebê aqui. Operamos e
ele vive bem agora”, comenta Silvia. A mesma sorte não teve
um veado catingueiro. Levado ao santuário por funcionários
da Dersa em 1º de agosto, morreu quatro dias depois. “Foi o
estresse. Quando os veados são capturados, é preciso ter muito cuidado”, observa Pompeu. O laudo da necropsiada veterinária Kelli Spitaletti constatou ferimentos por todo o corpo, além de congestão e edemas pulmonares.
Outros três veados catingueiros morreram na clínica veterinária de Felipe Giacobinilocalizada na cidade de Embu,
na Grande São Paulo. “Foi o pessoal da Polícia Ambiental
que trouxe os animais, em momentos diferentes”, explica o
veterinário.
EUTANÁSIA
Todos precisaram passar por eutanásia, por causa dos ferimentos múltiplos e da impossibilidade de sobreviver.
Um dos veados catingueiros, espécie ameaçada de extinção, estava com a coluna vertebral fraturada.
Outro teve a parte posterior do corpo mutilada por mordidas
De cães.“Com certeza foram cachorros da vizinhança
da obra. Os veados, à procura de alimentos, ficam perdidos
entre a urbanização e o Rodoanel.”
O Estudo de Impacto Ambiental do Trecho Sul identificou
a existência de 163 espécies de aves, 23 de mamíferos e nove
de répteis que habitavam as áreas das obras, principalmente
nas cidades de SãoBernardo do Campo e Diadema. As obras
começaram em 2007.
Culpa é da natureza
O gerente de Gestão Ambiental da Dersa, Marcelo Arreguy Barbosa, descarta qualquer tipo de crime ecológico nas obras do Trecho Sul do Rodoanel e afirma que a empresa está
preparada para executar o projeto de manejo de animais silvestres.
Para ele, a culpa pelas mortes é da natureza e o empreendimento deve ser isentado de qualquer ação de imperícia ou negligência. “Os animais receberam o tratametno adeqaudo. A natureza é a reponsável
tratamento adequado. A natureza é a responsável pelas mortes, jamais o empreendimento" (o Rodoanel) alegou.