Reproduzo carta do amigo Alípio Freire à Folha de S. Paulo contra o cinismo.
Campinas, 25 de maio de 2006
À coluna "Mônica Bergamo",do jornal A Folha de S.Paulo
Prezados senhores
Venho, por meio desta, me somar a quantos já escreveram manifestando protesto sobre o modo como foi noticiado, na coluna "Curto Circuito", pela jornalista Mônica Bergamo, o lançamento do livro do senhor Carlos Alberto Brilhante Ustra (também dito Ulstra).É intolerável (por, no mínimo, irresponsável) que tal informação seja veiculada sem o esclarecimento sobre o histórico do autor. Não apenas o senhor Ustra foi um dos mais cruéis torturadores do período da ditadura civil-militar implantada com o golpe de 1964, e responsável direto por sevícias e assassinato de diversos opositores daquele regime, como este é um fato público e conhecido por todos os cidadãos minimamente informados. Não faltam depoimentos e outros documentos que o comprovem.Omitir esses fatos implica conivência com a tortura.Noticiar e promover trabalhos de torturadores do modo como foi feito em "Curto Circuito", tem como resultado a "naturalização" da prática da tortura, significando, portanto, apostar na impunidade dos seus autores, o que é um modo de acumpliciar-se com os sicários.A não responsabilização e punição legal dos torturadores do período do regime civil-militar, garantidas pela Lei de Anistia (a anistia recíproca) de agosto de 1969, implicou a institucionalização do método. A não revisão até o momento dessa legislação e o silêncio a este respeito, significa a perpetuação da execrável prática.À impunidade garantida pelo Estado, que até o presente se alicerça no estatuto da "anistia recíproca" em que se fundou a Lei de Anistia de agosto de 1979, não deve corresponder o cinismo da sociedade civil.
Alipio Freire- jornalista
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