(Pensando em Roberto Piva)
Um poema está escrito no lençol que voa do armário no caminhão de mudanças
Da Gare de Lyon até Santa Cecília é noite no Ocidente
Na hora sem estrela o poeta flana
Madrugada de ecos
“Oh cidade de lábios tristes e trêmulos onde encontrar
Asilo na tua face?”
Não é de plumas seu discurso
É canino pontiagudo.
Heterodoxo e numinoso
Sangra a carne no Restaurante Brasileiro
Brada o poeta gesticulando
ecoa Hölderlin
“e para que ser poeta em tempos de penúria”?
Enquanto seus coturnos pisam corações desavisados
Predador voraz de décadas
Caçador de ovos azuis e coxas sem celulite
A vida sempre foi andar
Na hora sem estrela o poeta flana
cidade de pedras e luz
esconderijos escancarados
nem pai, nem mãe, nem mestre
quando o rouxinol gorjear será a hora
dos garotos que passam e de esticar o olho esquerdo
poetas bêbados confraternizam na madruga
estalando línguas
escorre do caminhão de lixo um livro de poemas sujos.
São Paulo, 4 de outubro de 2010
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