Por detrás de cada pedra
Por detrás de cada homem
Por detrás de cada sombra
O vento traz-me o teu rosto
(Roberto Piva)
Acho que todos que estávamos no dia 6 de março no evento para juntar fundos para o tratamento do Piva devíamos isso a ele, de alguma forma. Pensei nisso lendo o texto do blog do dramaturgo, que sequer conhecia o poeta, mas muitas vezes o viu e leu.
Eu também não o conhecia, só daqui, dali,deste, daquele bar, de vista. Anos , séculos atrás. O dramaturgo diz que foi sua primeira noite de vinho, depois de tudo que lhe aconteceu, e que se arrastava com dificuldade. Eu vi.
Ele declamou o poema de Paranóia (1963)-Boletim do mundo mágico- e do meu lado o professor Boris Schnaiderman e a mulher dele, professora Jerusa Pires, generosa gente amante da poesia, gostaram do que ouviram. E olha que o professor Boris, do alto dos seus mais de 90, deve até ter visto o próprio Maiakovski declamando. O grande poeta morreu em 1925 e o professor ucraniano chegou ao Brasil em 1930...
Noite meio encantada, porque logo que chego encontro na porta meu velho amigo de adolescência e companheiro de rodadas de poesia, quando estudávamos no inesquecível colégio estadual da zona norte de Sampa. Então, o Edson ainda ama a poesia, como a amávamos desde crianças, eu pensei, feliz. Querem coisa mais incrível num mundo desses?
A namorada do Edson, depois mãe de suas filhas, Lucila, também nossa querida companheira de rodadas de poesia, já tinha partido há uns 10 anos.Saudades, sempre. Ela estaria lá também naquela noite, se é que não estava. E Boris Schnaiderman havia sido seu professor na USP, lembramos...Noite encantada, porque muitos fios se juntavam.
O poeta da Paranóia nos reunia. A alma da poesia vagando entre doidos (as) de pedra y loucos varridos (as). Eterna tribo sempre, e claro, como iria faltar o Marsicano tocando Coltrane y etc. na cítara?
Bortolotto havia se salvado milagrosamente.Leio no seu blog que, naquela noite, chegando em casa, sentiu que estava de volta. Definitivamente. Ou provisoriamente. E algum de nós sabe?
O casal Schnaiderman foi cumprimentá-lo pela declamação.
Meu ex-colega do colégio saiu no meio do evento, como fez a vida inteira- deu um tchau rapidinho, anotou meu telefone e desde então me manda emails engraçados e/ou comoventes.
Muitas apresentações depois, dei carona para o casal russo/baiano, que por outras vias meio encantadas havia conhecido meses antes, e até tomado um chá da tarde no apartamento-bliblioteca deles. (Um belo homem este, com seus olhos azuis tranquilos, onde se vê o amor e o cuidado pela mulher. Que sorte a deles.)
A noite estava suave, sim. Me despedi deles, olhei para a lua, respirei: às vezes, mesmo por motivos graves e tristes, a vida tece fios dourados enredando pessoas especiais, fora do tempo, a sincronicidade, um átimo de encanto.
2 comentários:
Texto comovente, Beth. Bom lembrar do Edson Mota, da Lucila, do Piva declamando envolto no som mágico do Marsicano.
Jô querido, aquele nosso colégio, ao longo da vida, sempre...
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