sexta-feira, abril 30, 2010

A noite de quarta na Livraria da Vila

Tinhorão e o grande Renato Pompeu








Atrás do Nassif, queridos amigos Jorge Okubaro- jornalista e escritor- e Nancy


Fotos Jeus Carlos/Imagemlatina

quinta-feira, abril 29, 2010

Irmandade

Octavio Paz

Enviada por Leonel Delalana Jr


Sou homem: duro pouco
e é enorme a noite.
mas olho para cima:
as estrelas escrevem.
sem entender compreendo:
também sou escritura
e neste mesmo instante
alguém me soletra.

terça-feira, abril 27, 2010

No caderno Mais, 25/4: Voz dissonante

Um dos principais historiadores da música popular brasileira, José Ramos Tinhorão diz que a produção de canções se restringe cada vez mais a nichos e critica o silêncio da academia em relação à sua obra
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Quatro meses antes de, em já famosa entrevista à Folha realizada em 2004, Chico Buarque afirmar crer na possibilidade do fim da canção, José Ramos Tinhorão dissera o mesmo à mesma Folha. Foi bem menos lido e mais atacado do que Chico, naturalmente.Aos 82 anos, Tinhorão parece não ter se desviado em nada do percurso que começou a trilhar em 1958, quando recebeu a incumbência de escrever sobre música no "Jornal do Brasil" e se tornou um dos mais originais frasistas, ensaístas e historiadores da cultura popular do país. Quando se debruça sobre um assunto, chega muito antes dos outros ou já chega imprimindo uma visão absolutamente peculiar.Tinhorão lança mais dois livros, alcançando a marca de 28: "A Música Popular Que Surge na Era da Revolução" (ed. 34, 176 págs., R$ 32) relata, com fartura de informações, o que aconteceu na música em Portugal e na França por conta da Revolução de 1789; "Crítica Cheia de Graça" (ed. Empório do Livro, 160 págs., R$ 43) compila alguns de seus textos publicados na imprensa, atuação que lhe custa até hoje o ódio de bossa-novistas, tropicalistas, jazzistas, roqueiros e outros times.E, ainda, com a publicação da biografia "Tinhorão - O Legendário" (Imprensa Oficial, 280 págs., R$ 20), de Elizabeth Lorenzotti, e a instalação na sede carioca do Instituto Moreira Salles do enorme Acervo Tinhorão, fica difícil suas ideias não voltarem à tona, embora muita gente as preferisse sepultadas."A figura do artista como conhecemos, romântica, vai acabar. O engenheiro de som vai ser mais importante do que o artista. Hoje, fabrica-se som, em breve não será preciso tocar nenhum instrumento. Quando vem uma dessas bandas tocar aqui, a imprensa exalta as toneladas de equipamento que elas trazem. Hoje, a música popular se julga por toneladas", afirma ele.O rap, o funk, a música eletrônica e boa parte da música pop já não têm os instrumentos como eixo, e sim as programações feitas em computador. Estas exigem musicalidade, claro, mas não a derivada de cinco séculos de música tonal, tradição que culminou nas canções, como aponta Tinhorão."Não existe mais gente buscando novas sínteses. A hegemonia hoje é a média, a repetição. Nada acaba, a canção de qualidade vai continuar a ser feita, mas viverá em nichos, como aconteceu com a ópera e o quarteto de câmara. [José Miguel] Wisnik e [Luiz] Tatit continuam a fazer canções porque gostam, mas não há como fugir do processo histórico", afirma, referindo-se a dois compositores-ensaístas que já criticaram sua visão do fim da canção."Processo histórico" é uma expressão que remete ao marxismo -ou ao "materialismo histórico-dialético", como ele prefere-, que foi a base de seus ensaios sobre música na imprensa, especialmente nos dois períodos no "Jornal do Brasil": 1958 a 63 e 1975 a 81. Eram ensaios porque Tinhorão costumava partir de um disco para fazer uma "análise sócio-histórico-cultural", o que seria impossível hoje, por falta de espaço, formação e porque nos acostumamos a dar dicas sobre um produto que será consumido, e não escrever sobre uma suposta criação artística.Críticos"Não sou crítico. Renzo Massarani, Edino Krieger e Mário de Andrade eram críticos, entendiam muito de música. Hoje, existem críticos de discos, que escrevem na base do "gostei" e "não gostei" e procuram agradar a sua corriola", diz.A formação marxista ajuda a explicar a sua aversão à bossa nova, a mais notória e longeva das brigas que comprou -e que lhe rendeu fortes ataques de Caetano Veloso e muitos outros, além de anedotas como a de que Tom Jobim começava o dia urinando num vaso de tinhorão, a planta.Para Tinhorão, o ensaísta, se havia influência do jazz na bossa nova, sendo esta "filha de aventuras secretas de apartamento com a música norte-americana", como escreveu em 1963 na revista "Senhor", João Gilberto, Tom Jobim e os demais estavam se afastando da cultura popular brasileira e entendendo como "de maior qualidade o que era produzido no equivalente de sua classe nos Estados Unidos". Mais do que nacionalista, Tinhorão estava e continua sendo, digamos, "classista". "Toda cultura é cultura de classe", resume, num axioma marxista."Tom era um bom músico, um bom harmonizador, mas não um criador. Eu tenho uma memória musical desgraçada, ouço uma vez e não esqueço, e posso te dizer que 16 músicas do Tom têm anterioridade", repisa ele, fazendo associações entre "Mr. Monotony" (Irving Berlin) e "Samba de uma Nota Só"; a "ouverture" da "Ópera dos Três Vinténs" (Kurt Weill) e "Sabiá"; o tema folclórico "Água do Céu" e "Águas de Março".São aproximações discutíveis, e Tinhorão não as chama de plágio. "Quando fez "Insensatez", por exemplo, ele não sabia que estava repetindo uma lembrança de Chopin."AutodidataTinhorão acaba falando de bossa nova mesmo sem ser provocado, embora logo no início da entrevista diga que odeia ser chamado pelo clichê de "polêmico" e que o tema não interessa mais. Só que é inevitável passar por ele para chegar ao fato de o autor não ter conquistado, apesar da profusão e da profundidade de seus livros, o reconhecimento que deseja."Daqui a 50 anos, quando se quiser conhecer a música brasileira do século 20, as pessoas vão ler Tinhorão, Zuza Homem de Mello, Sérgio Cabral, e aí sem influência dos julgamentos anteriores, feitos a quente", afirma ele, apostando que os futuros jovens o descobrirão.Quanto ao reconhecimento da academia, a revolta é maior e a esperança parece menor. Ele se vê alvo de preconceito por ser um jornalista que se tornou historiador autodidata, indo por conta própria às fontes primárias, especialmente no Brasil e em Portugal."Sou muito citado nos livros acadêmicos, mas só como apud [quando se aponta o autor que teve acesso à fonte original], porque eles não têm outra forma de dizer de onde tiraram aquelas informações, já que eu tenho obras que não existem nem na Biblioteca Nacional [no RJ]. Eles ficam citando [Jacques] Le Goff, os mesmos, estão presos na bibliografia europeia, em especial francesa", critica ele, garantindo nunca ter tido um dado de livro seu contestado. "Como não podem me refutar, preferem me tratar com o silêncio."Os ídolos de Tinhorão na música, como se pode prever, são os artistas populares que fazem muito com pouca formação e não mudam sua maneira de criar e viver mesmo após lançar discos e entrar na indústria cultural. Um paradigma é Nelson Cavaquinho."A originalidade dele resulta do seu primitivismo. Roubaram-lhe o cavaquinho, alguém deu um violão e ele, que era para ser um tocador de cavaquinho, virou um tocador de violão, daquele jeito único, que fundiu a cuca do [violonista clássico] Turíbio Santos. Com extrema limitação de possibilidades, ele conseguia fazer melodias inexplicáveis. Não tinha nem coordenação motora, sua letra ia subindo no caderno. Claro que eu tenho que elogiá-lo. Esse é um criador", exalta.


Tinhorão em perspectiva


Biografia relata formação do jornalista e historiador, que reúne em livro textos publicados na imprensa e faz abordagem original em obra sobre música popular do final do século 18

DA SUCURSAL DO RIO

Considere-se isso um mérito ou um agravante, José Ramos Tinhorão assume que o estilo ácido que fez sua fama não era apenas fruto de um inerente e incontrolável "veneno" -palavra que já foi muito usada ao lado de seu nome-, mas uma postura ideológica.
"Eu precisava marcar posição. Não ia dar colher de chá para aquele pessoal embrulhado numa coisa ilusória", diz, referindo-se a artistas influenciados pela música estrangeira.
É mais fácil entender essa postura, mesmo que para rejeitá-la, lendo a coletânea "Crítica Cheia de Graça" e a biografia "Tinhorão - O Legendário".
A primeira, antes de tudo, porque muito se fala (mal) de Tinhorão, mas pouco se lê seus escritos. E lê-los permite ter um contato direto com as fontes de tantas turbulências e perceber que havia uma ideia sob aqueles argumentos, ainda que se possa odiá-los -e, até hoje, é praticamente impossível ler os textos sem ter alguma reação passional a eles, prova da eficácia do "veneno".

Metralhadora
Nenhum disco era um tema em si para Tinhorão. "Realce" (1979) serviu para ele analisar a "americanização" de Gilberto Gil; "Brasil" (1981) para ressaltar o "mal" que o "violão gago" de João Gilberto e a bossa nova fizeram à música brasileira; "Desbunde Total" (1970) para reiterar que Johnny Alf tomara o caminho errado desde a escolha do nome artístico.
Para não se dizer que ele não falava de flores, há, por exemplo, dois artigos exaltando Geraldo Vandré (de 1974 e 1979, pós-exílio e pré-conversão aos ideais militares) e um, de 1973, tratando Chico Buarque como "o maior compositor brasileiro de música popular, ao nível da classe média de cultura universitária" -opinião que ele mantém. O livro ainda reproduz duas belas entrevistas com o sambista João da Baiana e o radialista Ademar Casé.
Tanto na coletânea de artigos quanto na biografia escrita pela jornalista Elizabeth Lorenzotti está um dos melhores textos de Tinhorão, censurado em 1975 pela direção do "Jornal do Brasil" por aventar a possibilidade de haver racismo no Brasil, tema que a ditadura não permitia. "Por que artista crioulo tem sempre que ser engraçado?" toca nos esforços da indústria cultural em estereotipar artistas negros.
Outro percurso brilhante Tinhorão faz em "Marx explica Menudo", em que mostra como os grupos de adolescentes se inserem na esfera de ampliação do mercado consumidor, e conecta isso com a ameaça da pedofilia.

Formação
Baseado, sobretudo, em entrevistas com o próprio biografado, "O Legendário" conta a história do menino de Santos, pai português e mãe filha de espanhóis, que se mudou cedo para o Rio -onde conheceu muitos personagens de seus futuros livros, como sambistas e malandros- e só voltou para São Paulo em 1968, para a primeira equipe da revista "Veja". Na década de 1950, na função de redator (ou copidesque, como se dizia) do "Diário Carioca" e do "Jornal do Brasil", ganhou o apelido que dá título à biografia, por causa da qualidade de seus textos-legenda -os que contam as histórias mostradas pelas fotos.
"A Música Popular Que Surge na Era da Revolução" está em outro terreno, o das obras do historiador Tinhorão que se tornam referência por causa das abordagens originais de assuntos remotos e das raras fontes de informação que ele oferece. (LFV)

domingo, abril 25, 2010

Benjor no Circo Voador

No dia de São Jorge, só deu Benjor. Eu assisti ao seu show, pura alegria, no Circo Voador. Que festa melhor para encerrar minha estadia na Cidade Maravilhosa?Jorge, perto dos seus 70 anos, ficou 3 horas no palco. E eu vi, ele foi dos únicos de sua geração que renovou seu público. A única música de outro foi do eterno Tim Maia, o nosso síndico, que lá no céu, deve estar feliz, com tanta gente cantando seu nome.E ainda cantou Bebete Vambora, eu nem me lembrava que tinha música com meu nome, só mesmo o Jorge, para mim sempre Jorge Ben, salve simpatia!

quarta-feira, abril 21, 2010

Nova enchente no Rio, esta mais perigosa

Foto Berg Silva

-Thiago Feres, Jornal do Brasil
RIO DE JANEIRO - Um grande evento da Igreja Universal do Reino de Deus reuniu nesta quarta-feira cerca de 1 milhão de pessoas na Enseada de Botafogo e provocou um verdadeiro nó no trânsito na Zona Sul, com reflexos até o Centro do Rio. Diante dos problemas, a prefeitura assumiu a responsabilidade por ter autorizado o evento, mas culpou os organizadores, que teriam dado “informações incorretas” sobre a quantidade de ônibus que trariam os evangélicos de vários pontos do estado. Em nota, o prefeito Eduardo Paes prometeu não mais autorizar eventos desse porte na Praia de Botafogo. Procurados os representantes da Igreja Universal não foram localizados nesta quarta pelo JB.
A previsão inicial era de que aproximadamente 100 mil pessoas comparecessem. Segundo a Polícia Militar, porém, o contingente foi dez vezes maior, e o esquema especial montado de véspera pela Guarda Municipal, em parceria com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio), não foi suficiente para evitar o caos.


(O Globo) Estação do metrô de Botafogo é fechada para evitar superlotação

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Inacreditável. Eu levei 1h30 hora para um trajeto que levaria 15 minutos. Na volta, das 18h30 até 22h30 para tentar chegar ao Jardim Botânico.
Inacreditável que uma prefeitura se diga mal informada sobre um evento dessas proporções, e o Secretaria que não encontrei a pasta diga que soube pelos jornais. Uma cidade inteira , em pleno feriado, prejudicada por um culto que, em primeiro lugar, não poderia ser realizado na Praia de Botafogo. Em SP há um lugar especial para esses cultos, na zona norte, e o trânsito é previamente desviado. Agora imaginem fecharem uma estação de metrô "para evitar superpopulação". Seria cômico se não fosse trágico.

Neste caso, trata-se de uma clara demonstração de poder desse bispo que conseguiu ser dono de uma emissora de TV e de um império às custas do dinheiro extorquido dos pobres que acreditam na salvação que ele prega. Estou curiosa por saber se os jornalistas que trabalham na TV RECORD, DO BISPO, como Paulo Henrique Amorim. Luiz Carlos Azenha, Rodrigo Viana,vão comentar esse descalabro, já que agora denunciam tantos descalabros da Globo, a emissora onde por tanto tempo trabalharam.
O bispo ganhou.Ele é um dos donos do Rio de Janeiro, pobre cidade maravilhosa, que mal sai de uma enchente e cai noutra, esta, muito mais perigosa, porque invade corpos e almas.

terça-feira, abril 20, 2010

Deu no Segundo Caderno de O Globo


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Rio, 17 de abril de 2010





sexta-feira, abril 16, 2010

Tinhorão e Monarco



Foto Vic Pugliesi

Na Livraria Folha Seca, centro velho do Rio, lançamento do dia 14 de abril de 2010. Monarco da Portela foi abraçar o velho amigo. Há uma foto, no livro, do programa da TV Educativa, dos anos 80, com a Velha Guarda da Portela e Monarco ao lado de Tinhorão. Como agora. O grande compositor e cantor prometeu que vai para Sampa cantar na Vila Buarque, nas promoções do Lira da Vila, no Bar do Raí.Quando soube que era o ponto de encontro de Tinhorao todos os sábados, ele disse: "Pelo Tinhorao eu vou até de ônibus".

A noite de Tinhorão, o Legendário, no Instituto Moreira Salles





















Lá no alto da Gávea, a noite de autógrafos de 13 de abril ficou repleta de amigos e admiradores, pesquisadores da nova e da velha guardas, jornalistas, músicos: maestro Edino Krieger, o fotógrafo Humberto Francheschi, amigo de Tinhorão desde os primeiros tempos de jornal e que também tem seu acervo de 78 rpm no IMS;Edinha Diniz, especialista em Chiquinha Gonzaga, o produtor, diretor de rádio e TV, ator e jornalista Haroldo Costa; os jornalistas Janio de Freitas, Mauricio Azedo, presidente da ABI e colega de Tinhorão no JB, Wilson Figueiredo, dos tempos do JB,Gilson Campos, dos tempos do Diário Carioca, e tanta gente que não vou conseguir nomear. Mais de 200 pessoas.
A exposição reve curadoria do Tinhorão e a dedicação incansável de Fernando Krieger, Marcelo Nastari, Euler, Guilherme , coordenados pela Bia Paes Leme: um trabalho impecável.
No dia seguinte, na Livaria Folha Seca, do grande Rodrigo Ferrari, outra festa, desta vez com mesinhas na Rua do Ouvidor, mais jornalistas- Sergio Cabral, o pai, Ruy Castro, Antonio Carlos Athayde, e uma surpresa; Monarco da Portela, grande amigo de Tinhorão. Logo que chegarem as fotos eu posto.Por enquanto, fiquem com estas da Simone e da Nadia.





sábado, abril 10, 2010

Evoé Zé Celso!

Meu querido amigo, jornalista, escritor, artista plástico e militante Alípio Freire disse que "desde a montagem de “O Rei da Vela”; desde o lançamento do LP “Tropicália” no Som de Cristal; desde o desfile da da “Mocidade Alegre” (na Sapucaí) com seu enredo “Mamãe eu quero Manaus”, eu não assistia/participava de uma cerimônia tão séria e adequada".

Aconteceu dia 7 de abril, quarta-feira.

Do Estadão online

No dia 22 de maio de 1974 o encenador, ator e dramaturgo José Celso Martinez Corrêa foi abordado por homens armados que o encapuzaram, colocaram-no dentro de um carro e o levaram. Era mais uma prisão realizada durante o regime militar que tivera início com um golpe dez anos antes. Zé Celso foi levado para o Departamento de Ordem Política e Social, na região da Luz, onde passaria quase um mês. No Dops foi torturado. Passou pelo pau de arara e levou choques e golpes que lhe arrancaram alguns dentes. Depois foi jogado em uma solitária.

.Mais de três décadas depois, Zé Celso receberá autoridades do governo brasileiro ao som do Hino Nacional executado em ritmo de bossa nova em seu Teatro Oficina numa solenidade de celebração da democracia. Vestido num terno, ele será hoje, a partir das 14 h, o anfitrião da 35.ª Caravana da Anistia. Criada em 2001, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça tem como função analisar os requerimentos de pessoas que foram vítimas de perseguição política entre 1946 e 1988 (lei 10.559/2002). Desde abril de 2008, foi criada a Caravana da Anistia que aprecia processos em atos públicos, numa ação cultural de resgate de memória.


Clayton de Souza/AE

sexta-feira, abril 09, 2010

Tinhorão no caderno Eu&, do Valor Econômico de hoje

Torna-se público o acervo documental do jornalista José Ramos Tinhorão, historiador rigoroso e crítico ácido da bossa nova.

Do contra, por convicção

Por João Marcos Coelho, para o Valor, de São Paulo


Tom Jobim disse que regava com sua urina, religiosamente, um vaso de "tinhorão". Para Sérgio Cabral, "tinhorão é apenas uma árvore herbácea da família das Aráceas". E Ruy Castro o define como "bête noire" e "dragão da maldade" da bossa nova em seu livro "Chega de Saudade". Falem mal, mas falem de mim - nunca o dito popular foi tão adequado. Tom, Cabral e Castro podem partir para o desaforo pessoal ou a desqualificação do homem, mas é impossível bater de frente ou ignorar o pesquisador. Não dá para desconhecer os quase 30 livros de José Ramos Tinhorão sobre a música popular urbana, num enorme arco histórico que cobre do século XVI ao nosso século XXI.
E, principalmente, o rigor com que pauta seu trabalho. Aos 82 anos, e em mais de meio século de pesquisa primária - algo que o pessoal daqui não gosta de fazer, preferindo o "achismo" amadorista -, Tinhorão acumulou mais de 50 mil itens documentais, entre 6,5 mil discos 78 rotações gravados e lançados entre 1902 e 1964; 6 mil discos 33 rpm, os chamados long plays, gravados e lançados entre 1960 e 1990; 35 mil partituras de canções populares, além de mais de 14 mil livros e documentos raros, como fotos, jornais, cartazes, jornais, revistas, rolos de pianola e folhetos de cordel, com destaque para os 800 folhetos históricos, num arco de quase dois séculos.
Até cartas de jesuítas do século XVI Tinhorão conseguiu coletar. O tema é amplo, mas um só: a avenida principal é a música e a cultura popular urbana do Brasil, com suas inúmeras variantes. Uma ruela, por exemplo, levou-o ao namoro da música popular com a literatura (três livros formidáveis); outra travessa o fez retornar ao Portugal de seus pais; e ao caminhar numa terceira, entre tantas outras, Tinhorão esmiuça as origens da música popular a partir da Revolução Francesa.
Na terça-feira, o Centro Cultural do Instituto Moreira Salles, no Rio, entrega ao público parte desse fantástico acervo, após nove anos de catalogação e digitalização. Durante quatro dias estará exposta uma pequena amostra, em escolha pessoal do próprio Tinhorão: os primeiros jornais e folhetos de modinha publicados no Brasil, fotos raras de Pixinguinha e Noel, discos de samba anteriores ao "Pelo Telefone", tido como marco inicial do gênero. Tinhorão será personagem central de um bate-papo sobre seu acervo e autografará três lançamentos: dois livros ("A Música Popular que Surge na Era da Revolução", da Editora 34, e "Crítica Cheia de Graça", do Empório do Livro) e a biografia "Tinhorão, o Legendário", de Elizabeth Lorenzotti, editada pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Até o fim do ano a íntegra do acervo será disponibilizada para consulta pública, via internet ou no próprio Instituto Moreira Salles do Rio.
Tinhorão exerceu o jornalismo com brilho entre 1953 e 1989. As datas, específicas, referem-se a sua entrada no "Diário Carioca" e a sua demissão do "Jornal do Brasil", para o qual colaborava como crítico de música popular. Entre uma e outra, trabalhou em todas as redações possíveis, incluindo uma passagem por "Veja" e outra, muitíssimo bem-sucedida, pela revista "Nova", ambas da Editora Abril.
Além de exímio copydesk (redator que "penteava" e melhorava os textos dos repórteres), era dono de texto inteligente, cortante. Ia sempre direto ao ponto. O santista que adotou o Rio como segunda pátria encontrou em São Paulo a cidade ideal para assumir de vez seu lado pesquisador, ou melhor, de "historiador da música popular urbana", como gosta de se qualificar. O ano de 1979 foi o da ruptura total com a vida anterior: separou-se da mulher, para quem deixou praticamente tudo.
Mudou-se para uma quitinete no centro de São Paulo, atulhada de livros, jornais e documentos - dormia num "sleeping bag". Ficou só com o carro, que vendeu para financiar uma viagem a Portugal. Àquela altura, já tinha vários livros quase prontos, mas ninguém queria editá-los por aqui. Kafkianamente, teve vários de seus 30 livros lançados primeiro pela Caminho Editorial - dirigida por um comunista, como ele mesmo.
A força do Tinhorão historiador vem de sua busca sistemática de documentação primária para provar a tese marxista estrita de que a música popular constitui um campo privilegiado da resistência do proletariado ao sistema capitalista. Esse formão meio simplista orientou toda a sua vida profissional como crítico e historiador. Também se localiza nessa atitude sua principal fraqueza como crítico. Seu pecado era ser previsível. Todo mundo sabia de antemão quem elogiaria ou malharia. Para ele, não havia vida inteligente acima das classes populares. A famosa batida ao violão que João Gilberto disse ter criado observando os requebros das lavadeiras de Juazeiro, na Bahia? "Cascata, conversa fiada". Dick Farney? "Não, Farnésio Dutra". Excelente cantor? "Sim, mas de música americana". Tom Jobim? "Jobim começou querendo ser Villa-Lobos, depois se conformava em ser Cole Porter e acabou sendo só Antonio Carlos Jobim - ele não era um criador, era um bom músico".
Tinhorão arrolou 16 músicas de Tom com antecedentes conhecidos - ou seja, plágio. E não estava errado. As décadas posteriores provaram que Tom Jobim não faz feio quando perfilado ao lado de Cole Porter, George Gershwin e Stephen Sondheim; e que a bossa nova tem mais a ver com o West Coast jazz do fim dos anos 1940 e com Chet Baker e Gerry Mulligan do que gosta de admitir. Nada disso parece tão negativo hoje. Mas seu jeito xenófobo de invalidar qualquer criador musical que ganhasse mais de um salário mínimo o fez colecionar inimigos a granel.
Nesse sentido, ele foi mesmo o "dragão da maldade" para a bossa nova. Em março de 1962, sua série de artigos no "Jornal do Brasil" intitulada "Lição de Samba" chegou ao capítulo bossa nova.Tinhorão botou o seguinte título: "Bossa nova nasceu como automóvel de JK: apenas montado no Brasil". Em novembro, fez um copy maldoso no "Caderno B" do "Jornal do Brasil" a partir das informações que recebia de uma testemunha do célebre concerto da bossa nova no Carnegie Hall, em Nova York.
E quatro anos depois deu uma definição do gênero que ficou famosa: "Filha de aventuras secretas de apartamento com a música norte-americana - que é, inegavelmente, sua mãe -, a bossa nova, no que se refere à paternidade, vive até hoje [1966] o mesmo drama de tantas crianças de Copacabana, o bairro onde nasceu: não sabe quem é o pai".
Desde o início, no "Diário Carioca", Tinhorão tinha mania por recortes de jornais. Ele mesmo conta na excelente biografia de Elizabeth Lorenzotti: "Uma vez, o Lago Burnett me trouxe uma caixa embrulhada para presente, tinha um penico com um cartão: 'este penico era de Noel Rosa'".
Se você quer dar boas risadas com os excessos de um crítico xenófobo, mas refinado na escrita, leia a seleção de artigos que está na biografia de Elizabeth. Agora, se quiser se embasbacar com a qualidade e o rigor da pesquisa do historiador, então se encante com "A Música Popular que Vem da Revolução". Afinal, como talvez não suspeitasse Glauber Rocha, todo dragão da maldade embute um santo guerreiro.

quarta-feira, abril 07, 2010

Tinhorão e a Academia

Esta não está na biografia Tinhorão, o Legendário .Aliás, se eu fosse escrever todas as histórias do Tinhorão-- tantas ele me contou depois de terminado o livro no prazo exigido pela editora, e continua contando-- teria de escrever outro, e mais outro.Ele tirou do baú, a propósito da história que lhe contei sobre a censura do parecerista da Edusp ao meu livro sobre o Suplemento Literário do Estadão, em 2003.

Em 1991 ele foi convidado para escrever em uma revista da Unicamp, mas o próprio professor que o convidou disse que as normas erram "draconianas". Segue a carta, enviada em 28 de outubro de 1991, que é mais um atestado de integridade de um intelectual correto, e um deleite, como tudo o que o Tinhorão escreve.
Trata-se , talvez, de algo considerado comum e corrente nas publicações universitárias,e em outras, mas como bem lembra Brecht, não se deve considerar nada 'normal' nestes tempos.
"Não digam nunca - Isso é natural - a fim de que nada passe por imutável."

A cartinha:

Caro professor

Acabo de receber a carta datada de 21 do corrente mês, com seu convite para colaborar com "artigo, ensaio ou resenha crítica, sempre inéditos", para a revista "Resgate", da Unicamp. O convite -- em princípio amável -- poderia ainda ser considerado honroso, não fora pelo teor mais que inaceitável, até mesmo aterrador ( pelo que traz implícito) das, por V. Sa. mesmo ,chamadas "normas draconianas para os colaboradores".
E isto porque, segundo os termos dessas pré-condições para aceitação da produção intelectual alheia dão a entender, a Universidade de Campinas demonstra não se ter libertado, anda, dos cinco lustros de autoritarismo militar que nos deslustraram a todos.
De fato, aceito como geral o princípio que reserva aos editores de quaisquer órgãos de imprensa o direito de aceitar ou não escritos assinados, não se compreende que alguém possa -- em sã e democrática consciência -- vir propor essa espécie de "capitis diminutio" da responsabilidade intelectual, constituída por "sugestões para alteração", ou "pequenas alterações no texto".
E o que é mais inquietante, se chegue a sugerir o patrocínio do poder absoluto iluminado, para o caso de "alterações substanciais... sugeridas ao autor, que fará a devida revisão".
Considerando que "alterações substanciais" significa mudança do substantivo, no sentido de sua substância -- que é a parte essencial da coisa e, portanto, lhe define a qualidade -- a aceitação de tal intromissão equivaleria à renúncia da própria integridade por parte do autor.

Ora, se se considera que os espírito histórico da Universidade é o da secularização do saber, em oposição à teologia como "ciência dos deuses", não deixa de ser lamentável que, neste final do século XX, a Unicamp venha assim restabelecer o Olimpo em terra de caboclos. E, o que é pior, submetendo Palas Atena à tutela de Zeus, depois da luta de tantos anos para nos livrarmos de Ares.

Assim, enquanto aguardo o resgate da democracia intelectual nesse jardim campineiro de Academus, firmo-me, por enquanto desinteressado do presente de grego dessa "Revista Brasileira de Cultura" .

José Ramos Tinhorão

segunda-feira, abril 05, 2010

IMS/Rio recebe acervo de Tinhorão

Capa- Caricatura por Amilde Pedrosa, o Appe, presenteada a Tinhorão em 1965.


Em evento de comemoração, historiador da cultura urbana lança dois livros, participa de bate-papo e abre exposição com documentos raros sobre a história da música popular brasileira. Biografia do jornalista é lançada na mesma noite.

O Centro Cultural do Instituto Moreira Salles-RJ (r. Marquês de São Vicente, 476, Gávea) realiza, no dia 13 de abril, às 19h30, um evento que marca a chegada do acervo do jornalista José Ramos Tinhorão à Reserva Técnica Musical no Rio de Janeiro. O acervo, que passava pelo processo de catalogação na sede do IMS em São Paulo desde 2001, é composto por cerca de 6,5 mil discos de 76 e 78 rpm, 6 mil discos de 33 rpm, fotos, filmes, scripts de rádio, cartazes, jornais, revistas, rolos de pianola, folhetos de cordel, press releases de gravadoras e uma biblioteca com mais de 14 mil obras especializadas na cultura popular urbana, tema central de toda sua obra. Até o final de 2010, todo o material será disponibilizado para consulta.

Na mesma noite, haverá a abertura de uma exposição com curadoria do próprio Tinhorão que ficará aberta ao público até dia 16 de abril. A mostra tem o objetivo de ilustrar o que o jornalista define por acervo temático: um banco de informações documentais, literárias, iconográficas e sonoras capazes de atender à curiosidade ou busca de suporte para a compreensão da cultura popular urbana, a partir do século xvi. Serão expostos os primeiro jornais e folhetos de modinha que se publicaram no Brasil, uma série de fotos raras e inéditas de compositores e cantores como Baiano, Getúlio Marinho, Pixinguinha, entre outros, além de fotos originais de Noel Rosa feitas em estúdio. Os visitantes também poderão conferir discos de samba anteriores ao famoso “Pelo telefone”, de Donga, o primeiro registro fonográfico de Carmen Miranda, “Não vá s’imbora”, e a mais rara gravação de Francisco Alves, “O pé de anjo”. Um dos destaques da exposição são as peças que mostram as facetas artísticas pouco conhecidas do pintor Di Cavalcanti, que também foi ilustrador de propagandas em revistas, chargista político da Revista Fon Fon, capista de livros de Manuel Bandeira e João do Rio e até letrista da música “Rabo de peixe”, uma parceria com Alcir Pires Vermelho em 1956.

Também será realizado um bate-papo com o jornalista sobre seu acervo e o lançamento dos seguintes livros de José Ramos Tinhorão: A música popular que surge na era da revolução (Editora 34) e Crítica cheia de graça (Empório do Livro), além da biografia Tinhorão, o legendário, de Elizabeth Lorenzotti (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo).

Sobre José Ramos Tinhorão
Nasceu em Santos-sp, em 1928, e criou-se no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro. Em 1968, mudou-se para São Paulo, onde reside até hoje. É autor de uma extensa e diversificada obra sobre temas relacionados à música brasileira. Estudante da primeira turma de jornalismo do país, colaborava desde o primeiro ano, 1951, como repórter free-lancer da revista A Semana (Rio de Janeiro) e da Uairá (Curitiba). Em 1953, ingressou como jornalista profissional no extinto Diário Carioca. Cinco anos depois, passou para o Jornal do Brasil, onde acumulou as funções de redator e colaborador dos suplementos “Estudos Brasileiros” e “Caderno B”. Trabalhou também para os jornais Correio da Manhã, Jornal dos Sports, Última Hora e O Jornal; as revistas Singra, O Cruzeiro, Veja e Nova; e as televisões Excelsior, Globo, tve (rj) e Cultura (sp). Colaborou ainda com O Pasquim e as revistas Senhor, Visão e Seleções, entre outras.

Tinhorão, o legendário – Elizabeth Lorenzotti

Em São Paulo, o lançamento será dia 28 de abril, das 18h30 às 21h30, na Livraria da Vila, Rua Fradique Coutinho,915.

Escrito pela jornalista e escritora Elizabeth Lorenzotti para a coleção Imprensa em Pauta, da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, o livro conta a trajetória única do jornalista que foi contratado como estagiário no extinto Diário Carioca, na década de 1950, como exímio escritor de textos-legendas – daí o apelido que lá ganhou –, suas passagens por inúmeras redações – Jornal do Brasil, Correio da Manhã, O Cruzeiro, tv Globo, Veja, entre outras –, sua transformação em crítico polêmico de mpb, até seguir carreira como historiador da cultura urbana e se transformar em lenda urbana. O livro trata de seus embates com o pessoal da Bossa Nova – que sempre comparou a um carro montado no Brasil, mas de origem norte-americana –, de seu método, o materialismo dialético, e de sua persistente dedicação à pesquisa, que nunca recebeu financiamento. Também recorda o clima das antigas redações, povoadas por inesquecíveis nomes do jornalismo, com os quais conviveu. Como acentua Janio de Freitas na contracapa, seu colega e amigo desde o Diário Carioca: “uma pessoa singular, pela inteligência brilhante, pelo humor refinado, a cultura e a audácia intelectual, a coerência e o caráter”.

sábado, abril 03, 2010

Os quereres



Texto de Mário Bortolotto

À MODA DE FABRICIO CORSALETTI

A festa onde você vai se divertir
é a mesma festa onde vou aprender a dançar
O bar onde você vai se socializar
é o mesmo bar onde vou beber até cair
O lugar onde você vai se achar
é o mesmo labirinto onde vou me perder
O país que você vai adotar como pátria
é o mesmo onde vou me exilar
O lugar onde você vai rezar
é o mesmo lugar onde confesso meus pecados
O lugar onde eu quero estar é o lugar onde você mora
O lugar onde eu quero acordar é o lugar onde você dorme
O lugar onde vou morrer é o mesmo lugar
onde você vai pisar com suas sapatilhas de ballet
O lugar onde quero ser enterrado é o lugar onde você vai levar flores
No inferno que vou estar, vai ter um lugar só pra mim
E lá você não vai poder entrar

quinta-feira, abril 01, 2010

Memórias de uma moça bem comportada-2 A censura do parecerista da Edusp


A carta da Editora da Universidade de São Paulo recusando meu livro era de 21 de outubro de 2003. Cerca de um ano antes, eu havia enviado os originais sobre o Suplemento Literário (SL) do Estadão, adaptado de minha dissertação de mestrado na ECA, para um parecer.
Demoraram a achar um parecerista, me disse a responsável. E ele ficou quase um ano com os originais.
Você não se sabe nunca quem é o parecerista, mas ele sabe quem é você.
Ele não recomendou a publicação, alegando, entre outras coisas, que Décio de Almeida Prado -- grande intelectual, crítico de teatro, professor da USP e editor do Suplemento Literário (1956-1967)--, fez “afirmações problemáticas” no editorial de apresentação do caderno, e que a autora “precisa manter um certo distanciamento crítico em relação a elas.”
E argumentou: “Exemplo: ao falar do público-alvo do suplemento, o crítico argumenta que ele deve se distanciar do “leitor comum” do jornal, para ele “um eufemismo que esconde geralmente a pessoa sem interesse real pela arte e pelo pensamento (...). Uma publicação que se intitula literária nunca poderia transigir com a preguiça mental, com a incapacidade de pensar, devendo partir, ao contrário, do princípio de que não há vida intelectual sem esforço e disciplina”.
E continuou citando Décio: “O leitor desprevenido mas de boa vontade” poderia “satisfazer a curiosidade nas secções meramente noticiosas”. E perguntou o parecerista: “Como ficaria a maioria dos leitores do jornal, inclusive o das colunas, editoriais, matérias assinadas? Não saberiam pensar?”

Mais: “Na conclusão, a autora reitera essas ideias, aceitando plenamente as de Décio de Almeida Prado, quase cinquenta anos depois. Desconsidera sua prática não elitista na coordenação do Suplemento, apesar desses equívocos do discurso de apresentação.”
Ora, eu falei o tempo todo na abertura que o editor proporcionava aos novos talentos, e que publicava até inimigos, ou seja, não se pautava, como é costume antigo, por panelas ou por preconceitos...
Ainda atribuiu uma frase de Hannah Arendt a mim, criticando-a no mesmo sentido, de que (eu, pois não entendeu que era ela) seria elitista.
Nunca soube, nem procurei saber, quem é e qual a formação deste parecerista, incapaz de compreender uma das frases mais repetidas em todas as ocasiões em que se discute o SL do Estadão, e em muitas outras: “Não há vida intelectual sem esforço e disciplina”.
O leitor do SL teria de ser, e era, diferenciado do leitor do jornal, porque o SL, embora apenso ao jornal, não era jornalístico, mas literário e artístico, como apontava o projeto do professor Antonio Candido. E este foi um dos aspectos que me atraíram para o seu estudo.
E assim, a edição do livro foi censurada pelo parecerista: ele não concordava com as ideias de Décio de Almeida Prado, e pontificava, arrogantemente, que eu também não deveria concordar com elas.
Mas quem é ele, este incógnito envolto em espessas e intransponíveis brumas acadêmico-editoriais? Ele pode ser comparado à unha do pé de Décio de Almeida Prado? Cujas ideias, mais de 50 anos depois, estão perenizadas em dissertações, teses, livros. E o Suplemento que editou é, ainda, um paradigma para todas as publicações culturais, perdidas e sem eixo, deste século 21? O próprio Estadão lançou recentemente um caderno cultural, o Sabático, em que reproduz, sempre, matérias do inesquecível SL.
Comentei certa vez o caso com o professor Antonio Candido. Ele me contou que o mesmo já aconteceu com ele, se bem me lembro, no México. “Estou em ótima companhia”, então, disse a ele.
Depois deste episódio, soube de inúmeros casos semelhantes -- nada exemplares, coisa feia mesmo- em editoras universitárias, tanto em Ciências Humanas quanto em Exatas. Muitas vezes os autores são desafetos de pareceristas, e tão somente porisso, jamais terão seus livros publicados ali: o parecer será negativo. Em outros, os pareceristas não estão à altura do que lêem. E etc.
Lamentável é tratar-se de uma editora da USP- a mesma Universidade onde foi elaborado e aprovado o trabalho por uma gabaritada banca de professores que recomendaram a publicação; que tratava de eminentes professores da mesma Universidade, de sua criação, e do início da Faculdade de Filosofia.
Se eu tivesse levado a sério este parecerista, o livro Suplemento Literário- Que falta ele faz! não existiria, e não seria hoje, como é, bibliografia obrigatória em todos os estudos acadêmicos que analisam a história da imprensa e dos suplementos culturais. Não teria o belo prefácio do professor Antonio Candido, que tanto me orgulha, sempre:
(...)“Este estudo bem feito, honesto e oportuno conta a história do Suplemento Literário de O Estado de S. Paulo nos decênios de 1950 a 1970, registrando a mudança profunda que ocorreu nesse lapso de tempo no jornalismo, cada vez mais voltado para o imediato e o registro rápido. Partindo da boa fundamentação teórica e histórica, a autora analisa com precisão o material disponível, fazendo reflexões pertinentes sobre a função cultural da publicação estudada. Isto lhe permite mostrar qual foi o seu papel no momento e refletir sobre problemas da relação entre jornalismo e cultura. As conclusões são importantes e expostas com visão certeira sobre a natureza da imprensa cultural em nosso tempo”.

Não teria sido resenhado pela imprensa de vários Estados, por publicações de várias Faculdades de Jornalismo e de Letras (ler ao lado direito, em Marcadores,"Que falta ele faz") e não originaria tantos desdobramentos, palestras e discussões, até hoje. Publiquei-o quatro anos depois, em 2007.

Este é um alerta sobre o que se passa nos bastidores de uma editora como a Edusp que, só posso concluir, seleciona pareceristas aleatoriamente - quais são os critérios? - e ainda confia neles.
Uma universidade pública não pode ter uma editora gerida desta forma.
E parecerista não é censor, não tem de concordar ou não com o conteúdo da obra mas, no mínimo, deve ter o bom senso de opinar sobre sua relevância, ou a falta dela.

Ins't it a Pity? De George Harrison,com Eric





George e a compaixão
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Isn't it a pity?
Isn't it a shame?
How we break each other's heart
And cause each other pain