quarta-feira, setembro 30, 2009

Poesia, pois é

Manda a Beth Sigoli, e poesia é sempre benvinda.

SOLAR DE JUCA DANTAS

Dantas Mota


De "Elegias do País das Gerais" (1961)


Tarde já. Os fruitos e as crianças possuíam,

Nas primaveras frustras que então passei a ser,

Um sabor de saudade no mendigo que hoje sou

A despeito de transunto de velhas glórias

E humanas lidas. E da caspa em desuso

Que pontilha de grisalho meus ombros chovendo

Dando ao título de doutor de SiãoEste ar deficitário de despesa

Que busca, na ausência de terras e de teres,E na paciência com que suporto outros coronéis

O sentido de sua própria escravidão.Deste mundo não sou.

E nem lhe temo a noite.A noite com suas lenternas e seus ladrões

Terramotos e valhacoutos.Temo sim o dia que dela nasce

E com ele a burra de dinheiro, agasalhada e fiel,Cheia dos terrores noturnos de ontem

Contendo, ensimesmadas, as mesmas manhãs

Plásticas e portáteis de hoje

E em que se enfeixam, de uma só vez

O gado, a servidão de passagem, a infância

O luto, a vida e o direito de chorar.




José Franklin Massena de Dantas Mota (1913-1974), nasceu em Carvalhos, na época município de Aiuruoca, no sul de Minas. Formou-se em 1938 na Faculdade de Direito da Universidade de Minas Gerais e exerceu a advocacia tanto em sua região natal como no Vale do Paraíba. Viveu sempre em Aiuruoca, mas mantinha contato com escritores no Rio, São Paulo e Belo Horizonte. Amigo de Carlos Drummond de Andrade, com quem se correspondia e encontrava esporadicamente, Dantas Mota desenvolveu uma poesia sui generis. Leitor da Bíblia e redator afeito às lides jurídicas, ele desenvolveu com essas influências uma poesia que tem às vezes um tom cerimonial e profético, mas fundamente arraigada no solo mineiro.

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