sexta-feira, julho 28, 2006

Que Deus guarde Leonildes,Guarnieri e Florestan


Foto Carlos Bertomeu

Acabo de ler no blog do Mario Bortolotto, ator e dramaturgo, um texto emocionado sobre Guarnieri. Ele diz que o grande ator estava na fila para um transplante de rim que podia ter salvo sua vida. Mas recusou-se a furar a fila.
Que estava esperando há muito tempo...Justo o que acontece à maioria do povo brasileiro. Eu não teria feito o mesmo, meu Deus, não teria essa coragem, essa integridade. De que tamanho você fica quando sabe uma história dessas?
Eu me lembro agora do grande professor Florestan Fernandes, que morreu de erro médico num transplante de fígado. Vi num vídeo o filho contando que, certa noite, o pai já doente, ele chega em casa e a mãe conta que Florestan havia ido pro Hospital do Servidor Público Estadual.Assim sozinho, vestindo um roupão. O filho o encontra de noite, na fila...Não queria usar de nenhuma prerrogativa...
Que o FHC sugeriu, ofereceu tratamento nos EUA, mas ele não quis.
Dois homens: o que mudou a dramaturgia, sim - e quem não se lembra do Arena, e quem não se lembra de Eles não usam Black Tie?
Ator, compositor, dramaturgo:Arena conta Zumbi.
O outro homem, que mudou a sociologia, filho de empregada doméstica, escolheu o lado da mãe pra defender.Eu fui à casa dele um dia, mas essa lembrança é daquelas que você não sabe se é sonho ou é verdade...Qaul era mesmo o assunto? Premio Herzog de Anistia e Direitos Humanos? Histórias de Cuba? O que era, meu Deus?
Mas da emoção da inauguração da Escola Florestan Fernandes, em Guararema(SP), ano passado, pelo MST, sim, eu me lembro bem. Ele deixou sementes, deixou frutos.
Dois homens que tinham o mesmo sonho, o mesmo sonho meu, sonho meu, sonho de parte de minha geração:justiça e liberdade para todos.
Como não me lembrar também de minha mãe, mulher simples, que teria se emocionado com essas duas histórias? Porque era compassiva, e sofria na carne a história do outro. Minha mãe que também morreu num hospital do SUS, a parte pobre do Incor glamuroso, oonde se tratam presidentes e CEOs. E eu, eu não pude fazer nada. Até hoje, quase três anos depois, corre um processo no Ministério Público Estadual, mas quem sou eu para lutar sozinha contra a corporação da máfia de branco?
Que Deus guarde a todos, minha mãe que acreditava nEle, os dois homens que talvez não.
Que essas lembranças de gente dessa estirpe perdure eternamente nos corações.
Não são apenas essas três pessoas, há muitos outros grandes, conhecidos como eles, anônimos como minha mãe.
São eles que nos dão forças para acreditar na nossa espécie combalida.
Nesses tempos quase sempre de trevas que vivemos sobre a Terra, eles são a luz.

2 comentários:

  1. Anônimo5:12 AM

    Que Deus guarde a todos eles e aos seus frutos!

    Desculpe pelo furo naquela sexta, Beth. Fiquei esperando chegar meu carro (que não veio naquele dia), mas devia ter ido ver os meus amigos. Claro que me arrependi. Malditos hábitos da classe média.

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  2. Anônimo4:57 PM

    Ô Beth, que artigo bonito. Nosso país continua assim, sempre.Não resolve nada sabermos que não somos os únicos a viver essa discriminação. Mas um dos primeiros na expressão da nossa admiração pelas pessoas que amamos.Não resolve problemas.Dá uma certa satisfação.
    Só hoje estou entrando no seu blog. Ando envolvida na organização de uma exposição sobre o João,que toma todo o tempo e mais algum.Depois mando notícias.

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