No Rio de Janeiro:
A greve abortada
Victor Passos
No início de 1979, nós, jornalistas cariocas acreditávamos que iríamos deflagrar uma greve por melhores salários. Nosso dissídio era em fevereiro e no dia 31 de janeiro realizamos a maior assembléia da categoria até então. Cerca de dois mil coleguinhas lotaram o auditório da ABI no centro do Rio, a maioria deles na esperança de aprovar a proposta das redações: greve. Mas no final da longa e tumultuada sessão (teve gente que quase saiu na porrada) foi aprovado apenas um frustrante “estado de greve” que significava, absolutamente, nada!
A responsabilidade por tal inócuo resultado foi do pessoal do partidão (Partido Comunista Brasileiro) encastelado na direção do nosso sindicato e em postos de chefia nas redações. A eles não interessava greve. Politicamente tachavam-na de inoportuna, não é o momento e tal, aquele velho papo. Além disso, muitos deles, caso a parede fosse deflagrada, teriam que furá-la para, acima de tudo, manter os polpudos contracheques dos cargos de confiança que ocupavam.
Para relembrar essa história é preciso recuar até 78, quando os jornalistas do Rio conseguiram apear da presidência do sindicato o pelego José Machado, que reinava absoluto então há 12 anos. A chapa Unidade e Ação, chefiada por Carlos Alberto de Oliveira, o Cao, Argemiro Ferreira e outros era composta de representantes das diversas redações, mas controlada pelo pessoal da “igrejinha”.
Os representantes do Jornal do Brasil na diretoria eleita eram Fritz Utzeri, da Geral, e Graça Monteiro, da Economia. No fim de 78 e início de 79, a redação do JB, onde eu estava então, como repórter da Geral, era a mais mobilizada na época. Na Economia, por exemplo, além da Graça, lembro-me com carinho das “aguerridas” Ângela Santangelo, Teresinha Costa e Ana Lúcia Magalhães. Na Geral, Zé Luiz, Lima de Amorim, eu e outros.
O nosso dissídio se aproximava e a proposta a ser levada para a assembléia geral seria tirada em assembléias por redação. Coube ao JB fazer a primeira. Não desperdiçamos a oportunidade e aprovamos a proposta de greve. No dia seguinte, corremos para o sindicato e fizemos a edição do boletim Voz da Unidade, que seria distribuído à tarde nas redações: “JB propõe greve”.
Foi como um rastilho de pólvora. No dia seguinte, novo boletim: “O Globo reafirma: greve”.Depois, “UH vai à greve” e assim por diante. A categoria estava devidamente mobilizada e marchava em direção à paralisação. Os patrões estavam preocupados com tal possibilidade e já preparavam medidas para enfrentá-la.
Do nosso lado também existiam preocupações. Era preciso estabelecer contatos e conseguir apoio das sucursais, principalmente as de Brasília e São Paulo. A diretoria do Sindicato, salvo honrosas exceções, não movia uma palha sequer. Soubemos que o enviado a São Paulo para estabelecer contato, simplesmente deixou sobre uma mesa do sindicato da Rego Freitas alguns exemplares do Voz da Unidade e voltou pro Rio sem falar com ninguém.
Ricardo Gontijo era um dos poucos diretores do sindicato daqui em quem confiávamos e, a nosso pedido, resolveu nos ajudar, indo ele mesmo a São Paulo para estabelecer contato com os coleguinhas. Insisti que procurasse minha amiga, a Beth Lorenzotti. O encontro dos dois rendeu depois, na assembléia geral, o nosso melhor momento. Por inexperiência e falta de organização, não soubemos aproveitar.
A “congregação”, o partidão, também tomou suas providências e distribuiu seu pessoal pelo auditório lotado no dia 31 de janeiro de 1979, um sábado.Seus oradores inscritos falavam para embananar a sessão, como Milton Temer, que agradecia a presença de todos e falava do seu exílio (voluntário), como se todos estivessem ali por sua causa.
O nosso melhor momento chegou quando os representantes das sucursais do JB e do Globo em São Paulo subiram ao palco, onde estava instalada a mesa e declararam: “Se o JB no Rio parar, São Paulo pára”. “Se o Globo no Rio parar, São Paulo pára”. O auditório da ABI veio abaixo em aplausos. Era hora de encaminhar a votação da proposta de greve para aproveitar o momento o nosso favor.
Mas vacilamos e a “congregação mariana” que presidia a mesa foi passando a palavra ao seu pessoal estrategicamente distribuído, que com suas intervenções e questões de ordem, umas atrás das outras, foi esfriando a assembléia e virando a decisão final para um ridículo estado de greve. Para nós do JB, a redação mais mobilizada, restou, além da frustração, o epílogo do episódio. Meses depois, o jornal demitia 22 de sua redação, eu e os coleguinhas grevistas (ou carbonários como éramos chamados) entre eles.
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